Idade é sinônimo de sabedoria?

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Idade é sinônimo de sabedoria? Não necessariamente. O vinho aumenta a sua qualidade com o envelhecimento? Não necessariamente.

Passei parte da minha infância morando com os meus avós maternos. A minha “nona” era como uma mãe: sempre pronta para fazer o meu lanche preferido e ir pescar após ajudá-la a tirar o leite das vacas. O meu “nono” era um grande amigo: sempre pronto para sentar-se no gramado e conversar durante horas sobre assuntos aleatórios. Sinto muita falta deles. Se me perguntarem se eles eram sábios, a minha resposta é direta: com certeza! Aprendi muito com eles. E por serem pessoas idosas, associei, na época, idade à sabedoria.

Podemos pensar que a idade melhora as pessoas? Para alguém que toca algum instrumento musical ou se dedica a uma área de estudos, o tempo, com certeza, é um aliado. E este “melhoramento” também pode ser verificado no nível da ética? Pessoas idosas são pessoas mais éticas que os jovens justamente porque viveram mais e perceberam que a ética é sempre a melhor escolha? Claro que não!

Imagine a seguinte situação: você encontra, após 20 anos, um colega seu da faculdade de filosofia. É fácil perceber, numa simples conversa, se ele “evoluiu” enquanto intelectual. Obviamente, se ele se dedicou à “vida intelectual”, ele terá evoluído. Portanto, o tempo é sim um aliado no nosso aperfeiçoamento em muitos sentidos. E eticamente, ele terá evoluído como ele evoluiu enquanto filósofo? Assim como na vida intelectual, a resposta dessa pergunta depende de sua dedicação.

A minha tese aqui é a seguinte: para me tornar um excelente filósofo ou músico, preciso me dedicar, estudando e treinando muito. Para me tornar um sujeito virtuoso, também é necessário muita dedicação e esforço.

Segundo Aristóteles, as qualidades do caráter podem ser dispostas de modo que identifiquemos os extremos e a justa medida. Por exemplo, entre a covardia e a audácia está a coragem, entre a belicosidade e a bajulação está a amizade, entre a indolência e a ganância está a ambição etc. Seguindo o famoso lema grego do “nada em excesso”, Aristóteles formula a ética da virtude baseada na busca pela felicidade. Na Ética a Nicômaco, ele diz: “a virtude é, pois, uma disposição de caráter relacionada com a escolha e consiste numa mediania, isto é, a mediania relativa a nós, a qual é determinada por um princípio racional próprio do homem dotado de sabedoria prática”.

É possível falar que o envelhecimento nos dá necessariamente mais sabedoria prática? Não, porque para avançar na sabedoria prática precisamos do hábito. Assim como eu evoluo num instrumento musical na medida que treino, eu evoluo na sabedoria prática na medida que pratico as virtudes. Tanto as virtudes quanto os vícios estão em nosso poder. Com efeito, sempre que está em nosso poder o fazer, também está em nosso poder o não fazer; sempre que está em nosso poder o não, também está em nosso poder o sim. A virtude é um hábito e depende de nossa escolha.

Sabendo que há uma relação entre hábito e tempo, passo agora a distinção dos conceitos “tempo” e “temporalidade”. O tempo que falo aqui é a noção comum de tempo, do tempo físico, do relógio; já a temporalidade escapa à medição do relógio e é algo mais profundo. Pensar a nossa existência metafisicamente, e não simplesmente pelo tempo vivido do relógio, significa pensá-la por meio da noção de temporalidade. Ao encontrar um conhecido seu após 20 anos, você perceberá facilmente se ele viveu apenas imerso no tempo ou se ele viveu a sua existência por meio da temporalidade.

Agora, eu lhe pergunto: você “vive” ou “está vivo”? O fato de estar vivo pode ser definido biologicamente, mas o fato de viver depende de fatores que não se reduzem às ciências naturais. Para Nietzsche, em Considerações Extemporâneas, a diferença entre viver e estar vivo está no dever que temos de estabelecer metas para nós. As metas devem ser “altas” e “nobres”, exigindo o melhor de nós. “Estar vivo” é existir, mas “viver” exige autodeterminação.

Acredito que meus avós viveram a sua existência na temporalidade. Eu busco isso todos os dias e busco também viver e não simplesmente estar vivo. Como? Cumprindo minhas metas e justificando a minha existência com um propósito. Assim, sei que, ao envelhecer, quando estarei perto da morte, olharei para a minha existência como um todo e constatarei que terei vivido bem a minha vida e não a jogado fora. É isso que eu busco todos os dias.

Finalizo com Bertolt Brecht: “não temas tanto a morte, mas antes a vida inadequada”. Ah, e não se esqueça de escolher sempre bons vinhos, não importando o ano da safra!

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